segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Avanço do secularismo é apontado como uma das causas do enfraquecimento da Igreja Católica

A construção de uma "sociedade sem Deus", desvinculada de valores religiosos, contribui para a deserção de fiéis

Por: Itamar Melo

10/04/2016 - Zero Hora

Avanço do secularismo é apontado como uma das causas do enfraquecimento da Igreja Católica Carlos Macedo/Agencia RBS
Avanço do secularismo é apontado como uma das causas do enfraquecimento da Igreja Católica Carlos Macedo/Agencia RBS
Foto: Carlos Macedo / Agencia RBS

Transformações culturais vêm sendo, também, decisivas para a "descatolização" do Brasil. O padre e professor Leandro Chiarello localiza em fenômenos como a aceitação do matrimônio entre pessoas do mesmo sexo o tipo de mudança que o refluxo religioso desencadeia: 

– O secularismo é a construção de uma sociedade sem Deus. Essa é a tendência que estamos observando, a busca de uma sociedade desvinculada de valores religiosos. Não gosto de dizer católicos, porque parece que é só a Igreja Católica que está no barco. Não. É uma ação entre todos os cristãos.

Na Europa, em países como França, Alemanha, Holanda e Inglaterra, o avanço da secularização e o aumento da indiferença religiosa provocaram o fechamento de centenas de igrejas. Velhos templos foram vendidos e hoje abrigam lojas de departamentos, escola para artistas de circo, pistas de skate. A crise é tamanha que até outro ramo periclitante, o das venda de livros físicos, mostra-se em posição de superioridade: alguns templos foram convertidos em livrarias. Na Escócia, uma igreja luterana virou bar temático alusivo a Frankenstein.

No Brasil, não há nada tão extremado acontecendo, mas sacerdotes e fiéis enxergam as igrejas esvaziarem-se ano após ano. Tarcisio Scherer, 84 anos, vigário da Paróquia São Pedro, na Capital, ordenou-se em 1958. Ir à missa, afirma, era considerado uma obrigação, a atividade mais importante do fim de semana: 

– As igrejas enchiam, não só uma vez, mas duas, três, no mesmo dia. Era feio não participar, não expressar publicamente a fé. Era um escândalo. Havia uma pressão social. Agora, temos de ano para ano uma diminuição visível da frequência à missa.

Para Scherer, o Brasil vive com alguns anos de retardo o mesmo processo de secularização ocorrido na Europa. Ele associa a "descatolização" ao triunfo do consumismo e do hedonismo, acompanhado por uma oferta muito maior de atividades:

– Na época em que as igrejas estavam cheias, não havia outras coisas para fazer. Agora tem TV, tem videogame, tem estradas que permitem chegar à praia em uma hora e meia, há shows. É uma sociedade em que quanto mais as pessoas puderem curtir, mais elas curtem. Não têm tempo para a religião. Ainda restam fortes traços católicos, mas dizer que o Brasil ainda é um país católico, não sei.

As semelhanças entre o que ocorre no país e o que sucedeu na Europa precisam ser nuançadas, diz Silvia Fernandes, professora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Ela argumenta que, por aqui, em oposição ao Velho Mundo, pessoas que se declaram ateias ou sem religião são malvistas. 

– Sou contrária à ideia de que há um declínio da religiosidade. Dados de pesquisas qualitativas mostram que as pessoas têm buscado formas alternativas de viver a própria religiosidade – afirma.

O bispo Brustolin cita o espanhol José Casanova, tido como o maior especialista internacional em secularização, para quem os processos da Europa e do Brasil são profundamente distintos. No continente europeu, a secularização avançou carreada por um racionalismo arraigado. Dessa forma, quanto mais instruída a pessoa, menos religiosa ela é. No Brasil, essa relação não seria tão clara. O brasileiro tem um fundo religioso capaz de resistir com alguma firmeza.